Fotos: Arquivo e Divulgação
Eu também não sabia. Mas conhecia, surpreendentemente, todas as músicas do espetáculo... Elas me conduziram a uma viagem pelos tempos de criança, pelos momentos em que aprendi muitas daquelas canções com a minha avó. As lágrimas vieram. Claro. Inevitavelmente.
Porém, após tantos serviços prestados ao Brasil, Aracy Cortes morre em 1985, recolhida lá no Retiro dos Artistas. Lutou até o fim para receber do governo algo semelhante a dois salários mínimos. Não conseguiu.
O espetáculo que resgata a história
Uma roda de samba. É assim que os atores recebem o público entoando as encantadoras canções de Aracy. Ela, já com mais idade, volta ao palco de um antigo teatro e ali revive as emoções de suas memórias.
Com este drama musical, Dago Feliz e sua trupe evocam nossa memória esquecida. Assim como as nossas raízes culturais. Profundas e belas, mas igualmente esquecidas, em “Pra você que me esqueceu” essas referências recobram o antigo colorido e nos dão uma pista sobre o quanto ainda devemos estar perdendo.
No folheto de apresentação do espetáculo, o diretor dedica esse texto à Aracy Cortes. Sensacional!
“Dona Aracy,
Estamos lhe escrevendo para comunicar que resolvemos fazer um espetáculo sobre a sua pessoa. Sei que pode parecer “realidade fantástica”, mas acreditamos que isso de alguma forma chegue as suas mãos, ou melhor, a sua alma... ou a sua energia... ou a sua memória... Como nos deparamos com várias informações truncadas sobre o seu trajeto histórico, resolvemos, então, para a realização em cena do nosso projeto, comparar a sua trajetória artística a da nossa equipe criadora.
Pode parecer pretensioso, mas acreditamos piamente que isso seja possível. Talvez pela proximidade das angústias criadoras deste grupo no atual instante deste mundo. Embora esteja afastada dele há algum tempo, queremos, infelizmente, comunicar-lhe que este mundo não está tão diferente do que era quando a senhora esteve por aqui.
Depois deste pequeno arrazoado, vamos à explicação do que pretendemos fazer com o seu legado.
O espetáculo inicia-se com uma pequena roda de samba de mesa de bar recepcionando o público. Pensamos em um repertório que inclua nomes como Noel Rosa, Lamartine Babo e outros que a senhora ajudou a lançar como compositores. Lá pelo meio do espetáculo, citaremos vários outros autores para lembrar a importância do artista estar próximo de novos artistas que surgem... como a senhora fazia... Que acha da idéia?
Como temos imagens suas quase que somente em fotografias da época, optamos por não tentar uma reprodução fidelíssima a sua figura, mas sim “brincamos de ser a senhora”. Duas atrizes representarão o seu papel. Uma como se estivesse expressando a sua opinião já em tempo de mais idade, e a outra, no seu momento de trabalho mais atuante. São atrizes que acreditam, como a senhora acreditava, em um tipo de teatro que não cede ao mercado. Daí a comparação, lembra?
Um ator representará todas as figuras masculinas que em algum momento da sua vida foram importantes. Sentimos pela falta de um número maior de atores, mas a senhora não sabe como hoje em dia é difícil montar um elenco com muitos nomes... ou achamos que até saiba! Em função dos costumeiros recursos limitados de produção, um violonista fará o papel de orquestra. Mas não se preocupe com a qualidade musical. O violonista é realmente um ótimo violonista. Talvez consigamos um sopro... uma flauta... uma clarineta... mas ainda estamos à procura deles... A senhora sabe como são os músicos, não?
A produção está tentando, de qualquer maneira, resolver o eterno problema de custos, patrocínios, apoios culturais... enfim... e hoje em dia existem Leis de Incentivos Fiscais à Cultura que são muito complexas, mas já aprendemos a lidar com isso também. Não sabemos se na sua época era assim...
Quanto à direção, está nas mãos de alguém que já fez muitas direções musicais em vários projetos, e acredita compactuar com o seu pensamento “do artista que tenta não se dobrar às normas vigentes”...
D. Aracy, acreditamos realmente em tudo que expusemos. Sei que, por motivos óbvios, jamais receberemos uma resposta sua, que seja cientificamente provada. Mas a certeza dessa comunicação... desse diálogo entre diferentes épocas dentro da angústia artística da criação, de alguma forma acontece...
Respeitosamente e com carinho, um grande beijo.
Dagoberto Feliz “
PRÁ VOCÊ QUE ME ESQUECEU
Teatro Ópera Buffa - Praça Franklin Roosevelt, 82, Centro, São Paulo.50 lugares. tel.: (11) 3237-1980. Ingressos: R$ 20,00 (meia-entrada - R$ 10,00)
Sábados e domigos às 21hs. Até 27 de abril.
Ficha Técnica:
Companhia: Teatro do Arrebol
Autor: Cláudia Pucci
Direção: Dagoberto Feliz
Elenco: Evelyn Klein, Gisela Millás, Ivan Kraut, Tiê Alves
Gênero: Drama
Duração: 50 min.